Novidades no front do meu #ihdeumerda e feliz natal para todos.

Edu Penido, no timão, Gui Hamelmann na proa, a onda sobre a laje da ilha da Mãe, a pontinha da ilha, o “Zing3” e este manza assistindo a tudo com um nó na garganta. Deu certo. Menos de uma semana depois passei velejando por ali novamente, Foi duro, mas foi bom!
Boa tarde querido amigo e mais que querida amiga. Neste pré-natal do ano da graça de 2013 – e que graça recebi, meus queridos, minha própria vida! –, vamos atualizando você com as notícias destas duas semanas que se passaram depois que rolamos em cima daquela laje, na ilha da Mãe.
Antes de mais nada, porém, quero agradecer de coração às centenas (isso mesmo!!) de manifestações que recebi via celular, email, Facebook, Whatsapp, etc., etc. Das mais de 500 pessoas que me procuraram, apenas duas o fizeram de maneira ruim. Uma, apócrifa (ah, os covardes….) e outra, muito má, baixa, mesquinha e agressiva de uma velejadora de oceano que nem merece ter seu nome citado aqui. Que os deuses possam olhar por ela como fizeram por mim! De verdade!
Jamais imaginei, quando escrevi o relato do acidente, que isso fosse causar tanta comoção. Quis apenas desabafar, com a maior sinceridade possível, e usar a escrita, minha forma natural de expressão, como meio de tentar entender tudo que havia me acontecido e compartilhar um pouco dos meus erros com os amigos para tentar ajudar a evitar outros semelhantes. Apenas…
As infinitas reações de carinho que recebi, de todos os quadrantes, podem ter certeza foi o que me fez erguer a cabeça e seguir adiante com a certeza de que cometerei novos erros, mas jamais repetirei os antigos. Muito, muito, muito obrigado meus amigos queridos!! Eu não mereço tanto! E se não consegui responder a todos ainda é apenas por uma questão de tempo, já que estive totalmente dedicado às buscas nestes últimos dias. Me perdoem!
Não posso deixar de citar aqui o Nelson, do blog “Diário do Avoante”, que com seu texto com rasgados elogios (muito exagerados, penso eu!) me fez ir às lágrimas e relembrar toda minha vida e minha trajetória na luta política desde o Diretório Central do Estudantes na velha Universidade de Brasília. Quando sermos socialistas (querer olhar para o outro em detrimento de si próprio, resgatar os desvalidos, dedicar-se aos miseráveis, buscar uma sociedade mais justa e equânime, blindar-se contra o individualismo, o consumismo, a ganância e o egoísmo) não era visto como algo infantil, impossível, ruim ou risível. Mas isso é outro papo…
De todo modo, fico feliz em poder ter contribuído de alguma forma, mesmo que involuntariamente, com a noção de ética, algo tão escasso nos nossos dias. Não me reconheço em suas palavras, Nelson querido, mas reconheço que hoje em dia fazer apenas o normal (o certo, o correto, o digno) é algo que, infelizmente, se tornou muito raro e fico imensamente feliz em ser citado como exemplo. Valeu mesmo! Obrigado!
O barco – Bem, dito isto, vamos aos fatos. O primeiro e mais importante, o “Fratelli” sumiu. Isso mesmo! Nestas duas semanas foram feitos mergulhos, passadas garateias, sondas e nada. Varreduras nas areias de Camboinhas e Piratininga também resultaram em frustração. Nem um vestígio sequer. Deste modo, segundo gente da própria Marinha, a hipótese mais provável, pasmem, é que o barco tenha sido roubado.
A princípio relutei em acreditar nesta possibilidade. Que espécie de “espírito de porco” faria tal coisa? O fato de termos pedido socorro e passado nossa localização em fonia aberta no VHF, canal 16, pode ter ajudado. E como me disse um sargento: “hoje em dia tem vagabundo para tudo!”. De qualquer forma prefiro acreditar que o barco derivou e afundou em local ignorado. Embora o fato de não encontrarmos nem uma boia ou outro objeto sequer me deixe intrigado, claro. Fora que, aparentemente, nas duas horas que ficamos a bordo depois da capotagem a água não subiu na cabine (ou subiu muito pouco). Enfim…
Para mim, e especialmente para o Fábio, acho, o fato de não acharmos nada é muito angustiante. Fica uma sensação de um ciclo que não se completou. De algo inacabado. Além dos muitos objetos perdidos (de valor sentimental também) que poderiam ter sido salvos. Mas a vida tem que seguir adiante. E sendo assim, já localizei em Angra um veleiro do mesmo ano e do mesmo modelo, Velamar 32 desenho de Sparkman&Stephens, super bem cuidado que o dono, já com desconto, fez por R$ 80 mil. Não é o “Fratelli”, mas é um barco similar (até mais bem equipado em alguns aspectos) e que, tenho certeza, vai dar muitas alegrias ao meu amigo ainda. Só preciso que ele aceite! Porque o cara está todo triste, deprimido e relutante e nem quer saber de mais nada. Mas vai passar! Espero!
Vaquinha – Aqui já adianto aos amigos que sugeriram (e não foram poucos) que fizéssemos um crowdfunding (para os anglófilos), financiamento coletivo (para os modernos) ou a velha e boa vaquinha mesmo, que fico muito feliz com a oferta de ajuda. E aceito de bom grado, claro. Afinal, não sou milionário e, mesmo sabendo que o erro é todo meu e portanto o prejuízo também, a ideia de que a comunidade da vela ajude coletivamente é sempre linda, generosa, muito bacana e bem-vinda. Veremos!
De qualquer modo, o Lars Grael se ofereceu para sortearmos uma velejada com ele. Torben se ofereceu para sortearmos o “Lobos do Mar”, livro que foi best-seller à época e narra a história do Brasil 1 na regata de volta ao mundo, autografado por ele (e por mim, né?). Isabella Nicolas também ofereceu DVDs autografados do seu documentário “Senhores do Vento”, também sobre o Brasil 1, que fez o maior sucesso, e exemplares do seu livro sobre a história do cinema brasileiro. Merci!
E até amigos fora da vela ofereceram “prêmios” também. Tem um super músico (não cito o nome porque preciso confirmar ainda) e produtor musical que pode sortear uma ida ao seu lendário estúdio para acompanhar uma gravação (o cara produz todo mundo: Gil, Jorge Benjor, Lulu Santos, O Rappa, Vanessa da Mata, Titãs, Skank, Jota Quest, etc., etc., etc). Bruno Mazzeo disse que poderíamos sortear ingressos autografados de sua peça “Sexo, Drogas & Rock’n Roll. Minha prima, Joana Jabace, que é diretora de novelas na Globo (Avenida Brasil, Joia Rara…), disse que rola uma visitinha no Projac e tal. E por aí vai. Fique ligado que quando (e se…) rolar a rifa da quermesse eu aviso a todos!! Participe e ajude o natal sem fome da família Novaes! 😉
Mais erros – Revisando o texto que escrevi no calor dos acontecimentos percebi que algumas coisas ditas ali, depois de mais lembranças e reflexões, estão incompletas ou incorretas. Primeiro e mais importante, a previsão do tempo (no caso aqui, o estado de mar). Para um navegador, na função específica e até mesmo no termo genérico, a meteorologia é tudo. Ou deveria ser. O fato é que havia um aviso de ressaca no Rio que ouvi “de orelhada”, mal confirmei com a atalaia de Cabo Frio (que errou), e ignorei.
Quando recebi as fotos do Carlos Burle surfando seu “secret spot” no Rio, a laje da ilha da Mãe na ressaca(!!), fiquei arrepiado. Ali a pedra vai descendo lentamente, vai longe por baixo d’água e forma o fundo perfeito para subir uma onda enorme, potente (o lip grosso lembra o de Teahupoo, no Taiti) e longa. Eu sei disso na prática! Ufa!!
Mas é claro que a distração no celular foi a cereja deste bolo de gosto amargo. Se eu estivesse com o plotter (no caso o iPhone) ligado e atento à ele passaria muito mais colado na ilha da Filha (colado em terra, no caso, né?) e provavelmente nada aconteceria. Ou como diriam os antigos: “entre o Pai e Mãe prefira a Mãe. Entre a Mãe e a filha, a Filha”. Mas, na real, com aquele mar eu deveria era ter ido por fora de tudo mesmo… E, por ironia, entrei logo ali justamente para me abrigar mais. Depois que acontece é fácil dizer…
Segundo, não creio que o barco tenha realmente dado um 360° completo na laje. Pela posição que o mastro ficou (a bombordo) acho que o barco foi e voltou. E sendo assim, também não creio que eu tenha caído do veleiro. Na verdade, acho que fiquei preso embaixo do cockpit, com cabos, toldo (Bimini) quebrado, paneiro, etc. e que a sensação desesperadora de não conseguir me livrar e achar a superfície era isso. Toda hora eu batia em algo que me impedia de nadar. E demorou, demorou… No fim aquilo tudo que me prendeu, foi o que me levou para cima também quando o barco desvirou. E eu, na confusão, tive a sensação de que havia finalmente chegado à tona. Não lembro direito de qualquer forma! Fábio ficou segurando a escota do grande e lembra de ter voltado com ela quando o barco desvirou. Deve ter acontecido o mesmo comigo, só que involuntariamente. Obrigado, meu Deus!
Fora a falta de tudo (lanternas, bolsa de abandono, facas apropriadas, manicacas, manete da bomba manual, etc.) depois da capotagem, o que poderia ter nos salvado (e nem mencionei no texto anterior) eram simples baldes. Se tivéssemos nos concentrado em localizar os baldes (até tentamos…) e nas duas horas até o resgate tivéssemos ficado tirando água, muito provavelmente o “Fratelli” ainda estaria entre nós (isso se não foi roubado mesmo, né?). De todo modo, na hora do nervoso pensamos nas bombas e nem demos muita importância aos meios “tradicionais”. Até canequinhas feitas de garrafa PET cortadas, com três pessoas trabalhando direto, tiram centenas de litros d’água em duas horas. #ficaadica
Para aqueles que perguntaram sobre os aspectos legais, já adianto que se você quiser fazer tudo pelo procedimento-padrão do resgate de barcos naufragados vai ser caro, lento e burocrático. O melhor, segundo alguns amigos que entendem do assunto, seria resgatarmos o barco nós mesmo e depois comunicar às autoridades. E isso, claro, se o barco estivesse em uma situação que, na boa vontade, amadoristicamente, conseguíssemos salvá-lo nós mesmos e os amigos. Só um “alvará” para mergulho em naufrágio, equipe de resgate e tudo o mais é uma eternidade em tempo, dinheiro e burocracia. Haja custo-Brasil!
Mesmo assim, um “processo” foi aberto, é claro, para que expliquemos o acidente, a necessidade do resgate feito pela lancha da Marinha e outros fatos relevantes. Uma simples carta detalhada à delegacia da Capitania em Cabo Frio, local de registro do barco, já enviada pelo proprietário, parece que será o suficiente para dar baixa no registro. E como não havia seguro, e portanto valores e interesses de terceiros envolvidos, a coisa deve fluir sem maiores percalços. Aguardemos…
Pedro – Para aqueles que se preocuparam como Pedro, meu filho de 13 anos que estava na cabine, o próprio manda avisar que está tudo bem. Nenhum sinal de trauma ou ansiedade. E também, segundo o próprio, ele virou uma espécie de celebridade na turma do colégio com a aventura inédita e está até animado com sua incipiente vida amorosa (“Pai, há males que vem para bem”). Na verdade, acho que ele jamais realizou realmente o risco que corremos (ainda bem!) e como logo que olhou para cima já me viu ali, aparentemente numa boa, e depois saiu do “Fratelli” direto para a lancha “Anchova”, no nosso contrabordo, das minhas mãos para as do marinheiro, ficou na memória mais o susto mesmo! Ou como diria São Tomás de Aquino: “o conhecimento traz sofrimento”. Já o desconhecimento… Amém!!
Volta aos velejos – Apenas seis dias depois, no sábado seguinte, na regata que homenageia o patriarca da família Schmidt Grael, Preben Schmidt, do Rio “Sailing” Yacht Club claro, tive a oportunidade de montar novamente a ilha da Mãe e sua laje. A convite do nosso medalhista de ouro em Moscou, Edu Penido, e do comandante Sérgio Andrade, fui o navegador (que risco eles correram!) da máquina de regatas “Zing3”, o barco mais moderno e radical do Brasil hoje (um Tuzé 55 pés, quilha basculante, bolinas/fólios assimétricos, tanques de lastro, tudo em fibra de carbono, etc., etc.). Valeu Edu!! Inesquecível!!
Não preciso dizer que não tirei os olhos da carta no plotter (meu velho e sobrevivente iPhone) e para meu desespero, sugeri que cambássemos por precaução e o Edu, que timoneava o barco na montagem da Mãe, falou: “deixa comigo! E fica tranquilo!”. Palavras inócuas. Com os olhos grudados no ecobatímetro eu via a profundidade abaixo da quilha (de 3,5m) ir caindo até menos de 4 metros. Quando voltou a subir confesso que senti um alívio irresistível e uma alegria enorme.
E na hora mesmo, com as ondas (pequenas, no dia) quebrando ali do lado, não passava nem pensamento… Enfim, deu certo! Voltei, velejei, naveguei e me diverti. E isso graças a todos vocês que, com sua boa energia, carinho e até mesmo algumas confissões de cagadas semelhantes, me fizeram perceber que o mar é nossa casa e a despeito de tudo que aconteceu é nele onde temos que ficar mesmo. Mais agradecimentos e mais emoção!! Valeu por tudo, meus amigos!!
Humor – Para finalizar não posso deixar de comentar as piadinhas que já surgiram com o episódio, já que velejador é um ser sacana e bem-humorado mesmo. A começar por um aí, que no dia do acidente, poucas horas depois, enquanto eu tentava arrumar uma lancha para ir rebocar o barco, já mandou essa no Charitas: “Murillão, tu agora é medalha de ouro no freestyle! Deu um 360 em cima da pedra!”. Eu mereço!!
Torben já disse que na Instrução de Regata da Preben 2014 o percurso vai ser: “Largada nas proximidades do clube. Contornar a laje do Murillo, montar não porque o cara já fez isso. Montar a ilha da Mãe e do Pai por boreste…”. E o que teve de neguinho me cumprimento com um “Murillo on the rocks, por favor!” não foi moleza. Mas tudo com carinho e numa boa. Melhor rir do que chorar!! Nem que seja de nervoso…
Próximos capítulos – Agora é tocar para frente e desenrolar o barco novo do amigo. No dia 5 de janeiro vou ver o barco “novo” em Angra e pretendo fechar o negócio assim que puder e levar (com seguro feito e muita atenção, é claro!) o veleiro para Cabo Frio. Meus filhos Pedro e Gabriel, que foi parte preponderante do resgate, devem ir junto. Espero, sinceramente, que este episódio lamentável e tão doloroso para nós possa ter servido de alguma forma para ajudar você em suas navegadas por aí a ficar mais atento e preparado.
O fato de poder estar aqui comentando e até eventualmente rindo do que aconteceu não exime a minha culpa e responsabilidade. E nunca trará de volta tudo o que Fábio perdeu naquele dia. E jamais me tirará da lembrança a possibilidade de ter morrido e matado um filho e um amigo por pura inépcia e distração. Fica a lição aprendida da forma mais dura e cruel! E enquanto eu respirar (como é bom respirar!) vou lembrar daquela noite e daqueles momentos de aflição embaixo do barco.
Desejo a você e a todos os seus um natal de muita paz e um 2014 de muito sucesso e conquistas! Que os deuses e deusas dos mares e das águas possam continuar a nos abençoar eternamente e que os ventos sempre nos sejam favoráveis!
Feliz tudo, querido amigo e queridíssima amiga!! Obrigado mais uma vez!
Fui!!!
Murillo Novaes
Muito bom, Murillo! Muito bom, mesmo! Que você e os seus tenham um ótimo Natal e 2014 com muitas alegrias! Casaes & Família
Adalberto Casaes Enviado pelo meu iPad
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Pois é, no Brasil até barco afundado é roubado, paizinho sem vergonha esse.
caro Murilo,
desejamos a vocês e aos seus um super Natal curtindo esse presente de Papal Noel chamado ” estar vivo”.
Marquinho e Marco Antonio
sugiro que guarde o texto acima para sem retoques fazer parte das “memórias ” que eu sei um dia voçê vai escrever.
Valeus Marcos!!! Um natal de paz e harmonia pra vcs tb!!
Murilo,
Muito bacana a sua abordagem, a forma a qual você tem encarado tudo isso extraordinária. Não foi a primeira nem a última vez que um acidente do tipo ocorre, nosso esporte é bruto e cheio de perigos, contudo, é nele que nos encontramos. O mais importante não é ter acontecido e sim o que você fez quando aconteceu.
Muito obrigado por compartilhar suas apreensões e experiências, sobretudo, as mais íntimas que só um cara descolado como você seria capaz de fazer.
Abraços,
–
Matheus Eichler
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Grande Murilo, nos já sabíamos que você era um grande velejador. Agora sabemos que você é um grande homem.
feliz 2014 para você e sua família.
zilton silva/veleiro Travesso
Valeu, Zilton!! Um 2014 nota mil pra vc e os seus tb! Bons ventos, Murillo